Advertência!

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02 dezembro 2008

Narcominese





"A vida moderna tornou o ser humano um teórico nato, uma mistura insensata de filósofo, vidente e psicanalista amador, transformou os padrões ultrapassados, porém valiosos, em fecundas e surreais idéias falsas de controle, liberdade e autosuficiência. Todos neste mundo moderno, debaixo deste mesmo sol, observam, avaliam e comparam. Todos acham que sabem, acham que te conhecem bem, acham que sabem bem o que você sente ou deixa de sentir, acham que são referência em algo, acham que são ótimos em alguma coisa...Mas o melhor (ou pior) de todos os enganos mundanos modernos, é o engano de se achar capaz de enganar, o de achar que pode esconder algo, o de achar que pode disfarçar os intentos tão profissionalmente quanto Marlon Brando. Dê-me um falsário, dê-me um agnóstico, dê-me um arbitrário, dê-me um egoista ferrenho, Dê-me um Chauvinista, um mitomaníaco... Só nâo me traga um patético camuflador de intenções, pois esta vida não precisa de mais ilusão de óptica destes ilusionistas classe B analógicos..."

25 novembro 2008

Melhor que um tango argentino!



Ela esbarra em meus sentidos e me deixa mais humano, todo tempo que a vejo é um tempo a mais no tempo, é um riso a mais no riso e um contentamento amigo e dócil, irmão do vício. Melhor que um tango argentino? Eu comparo a uma cachoeira de sorrisos, ela me dá um minuto que dura mais que um ano, é pouco tempo, é muito tempo mundano...

E nossas crises? Só ela sabe das suas, eu pouco sei de nada, enquanto ela espalha a Iris de um verde esmeralda. Então o q fazemos? Não sei, se soubesse seria mago ou pouco menos... Distantes como azulejos distantes do mesmo banheiro, ela casa-se com o acaso todos os dias, me ajuda a tanger a tristeza que quer raptar minha euforia, joga minha hipoteca de hipóteses no chão, opina em meus casos de amor, me dá a mão no olho do furacão, achando q é apenas vento de ventilador.

Ela me escuta e resmunga em outra língua, ela me abusa e emenda outra rima, pede licença depois de passar, e gosta de gente, cordas de gente pra arrastar, e tem mil vozes, tem mil unhas pra pintar? “Tenho vinte, mas demoram pra secar”. Pisca e arrisca, canta sozinha num musical de reprise, de repente, de relance pisca e arrisca ao alcance. Tem toda maluquice, toda sandice na cachola, trago ela, amiga longínqua, como escapulário no pescoço da memória.

Não me pede quase nada, só sinceridade atrevida, enrolo a dúvida numa dívida antes de encontrá-la na avenida. De um lado eu faiscando maluquices na pista, do outro ela sem freios nem rédeas na vida, noite adentro, vida afora, colidimos a milhas por hora, desmaio zonzo no asfalto de nossa capital enquanto ela recebe flores de um admirador nada secreto no hospital.

30 outubro 2008

Palavra


Ele era velho e mantinha concepções velhas em sua cabeça, velha cabeça, tão novo, tão velha. Não havia nada neste mundo que pudesse ser dito, escrito, interpretado, representado, comentado e criado que não pudesse, incrivelmente, ser adaptado aos seus velhos parâmetros eternos. Numa longa caminhada em busca de felicidade, em busca de ar regozijante aos pulmões apertados por situações irônicas da vida. Ele que pouco tinha, guardava todo seu orgulho em pequenas coisas que possuia, um troféru de 1º lugar no concurso de xadrez da escola, uma foto do coral da igreja, uma carta de amor da primavera de 1986, um caderno com dedicatórias de amigos... de todas as coisas que possuia a de maior valor pra ele, jovem ancião, era sua palavra. Se não possuia nada ao menos possuia a palavra, homem de palavra pensava ele, e quantas vezes a quebrou? quantas vezes não a fez cumprir? haveria redenção para ele que não possuia nada?

Muitas eram suas dúvidas mas, a única certeza era, a de que pouco se espera de alguém que pouco tem, muito se espera da única virtude da qual um homem tem a oferecer... Sua palavra era tudo, quando o pouco vira muito. Quando se quebra a palavra se quebra a figura do homem, se quebra o troféu no chão da sala da censura e reprovação alheia, rasga-se a única carta de amor, silencia-se a voz no coral, perde-se o caderno de boas recordações...
Não conseguia manter sua palavra, aos poucos todos desacreditavam, todos percebiam o fraquejar, a mudança de planos, o deixar pra depois, as promessas de um ano diferente. Até que um dia apareceu em sua porta um livro, com uma verdadeira palavra, bela, maravilhosa e invejável palavra que sempre se cumpria, no fim de cada prazo se cumpria, então ele a admirou e aprendeu a tê-la pra si com se dele fosse, pra ele tornou-se a sua palavra. Depois disso mais do que a palavra escrita, ele tinha a palavra na ponta da língua falada e lembrou que no coral era cantada, nunca mais precisou fraquejar nem adiar pois a palavra falava por ele, quando o pouco vira muito.

30 setembro 2008

Faltando palavras


Cresci no espaço de tempo entre os aplausos e o lavar do rosto do palhaço, nunca me coube motivação para esperar o outro espetáculo, sempre fui mais menino no corpo, tinha a alma envolta numa nuvem de estar adulto que raiar de sol algum dissipava. Vivia tentando ser outro que não eu, inventando liberdade, uma que jamais chegou, de noite e de dia, em pé e deitado, não desistia de tentar, e era bom. A mãe com a boca cheia de palavras que eu vivia a catar pelo chão, coitada, ela nunca soube guardá-las direito debaixo da língua, aonde quer que fosse sempre deixava para trás um rastro de sílabas barulhentas que ninguém mais queria apanhar. Digo verdadeiramente que me importava mais com as que ficavam na sua boca, pois estas sim poderiam fazê-la sufocar, eram palavras grandes, que não ouso pronunciar ou ainda escrever. As que caíam me deixavam aliviado por que eu as recolhia antes que alguém tropeçasse. Um dia acordei e desisti de tentar liberdade, lembrei que não tinha certeza de já tê-la colhido pelo chão, acho que esta era uma das poucas que mainha conseguia guardar de forma correta dentro da boca, talvez por ser palavra pequena, de resto, bonita, e foi então que abri os olhos e corri para conferir, no fundo da casa, palavras recolhidas, caídas da falta de jeito de mainha para engolí-las, haviam tantas, mas não achei liberdade, e qual não foi o meu espanto quando percebi que não era só esta, amor também nunca escapou de debaixo da sua língua, e outras que preferi não mais perceber. Mainha derrubava tantas palavras por onde passava que por muito tempo cheguei mesmo a desconfiar que fosse coisa proposital, seu andar nunca foi trôpego ou coisa assim. Hoje, as palavras não mais caiem da sua língua, penso que viva agora num silêncio melhor, então aprendi que não se deve deixar cair o que guardamos de forma correta. Sinto falta de apanhar do chão tantas palavras.
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[Moro num silêncio alugado, desisti do sonho da palavra própria] André Gonçalves

09 agosto 2008

Criador e Criatura

Sentados à luz de uma lareira esplendorosa que espantava a golpes a escuridão daquela noite fria, homens da cúpula do rei Alicário II, filho de Anamatério “O Eterno Sal”, estavam reunidos numa noite de festa e cantigas em meio a um lauto banquete e belíssimas dançarinas. Viam-se abastardos com o tempo da caça e da colheita e adoçavam a boca com um vinho da adega que só era aberta uma vez por ano, eles esperavam atentamente as estórias do mago Ozilus de Escandelarte, o maior dos magos tendo vivido todas, e mais alguns dias, das 40 gerações passadas. Ozilus chamou a todos para a sacada da imensa varanda lateral e contou-lhes uma estória jamais sabida:

“Contarei uma estória de um povo que viveu há muitas eras de distância de nós, há muitos mundos de caminhada sem fim, eram seres fabulosos, criaturas perfeitas, porém, viviam sobre o julgo de uma maldição, viviam com eles em seu mundo, seres chamados de Problemas.
Eram chamados Homens, todos eles adestradores de problemas, dissolviam-nos para que pudessem descer por entre suas gargantas fatigadas e assim pudessem encontrar a paz de cada dia. Muitos deles não acreditavam no poder destes seres, mas eles eram a miséria dos homens.
Viver era adestrar problemas, um após outro, ou muitos de uma vez só, viver era como encarar o mar revolto em ondas, vagas que se recusavam a retroceder, uma maior que a outra, viver era como fugir do sol que nascia todos os dias

Problemas eram como bolas de neve, nasciam pequenos e ínfimos, se tornavam maiores como monstros do pesadelo real de quem os nutria calidamente com a falta de providência. Problemas não aceitavam menosprezo, problemas não aceitavam falta de atenção, problemas não aceitavam subestima alheia.
Estes seres maravilhosos foram forjados no fogo da vida com o intuito, a sina e a missão de adestrar problemas, de todos os tipos, de todos os credos, de todas as raças, de todo inconsciente coletivo. Problemas eram o passa-tempo amargo e edificante, problemas eram domesticados, amarrados e cativados para os que conseguiam dominá-los. A maioria deles tinha por ventura um ponto fraco, era no meio de seus olhos famintos por adestradores fracos (amadores da falta de experiência).
Um problema tinha neste mundo a missão de se agarrar com unhas e dentes sobre o alvo para o qual foi criado, um problema era feito para procurar, imobilizar, sugar e talvez destruir seu mestre. Contam que o ponto fraco destas criaturas era entre os seus olhos, e só podia ser tocado se olhassem a criatura de frente e encarassem-no fixamente, destemidamente, desmedidamente bravios.
O maior dos problemas era aquele que se instalava, criava, reproduzia e proliferava outros assim como o primeiro, criaturas ferozes e abomináveis. Contam que Sir. Amadeus D´Gaule, um grande cavaleiro, matou o maior dos problemas na colina do Desespero Errante, à margem do Penhasco dos Cortadores de Pulso, a leste da Vila do Desencanto, junto a uma grande depressão acidental. Seus esforços foram tamanhos que a batalha durou por 7 dias e 7 noites e, tendo Sir. D´Gaule abraçado a defesa do pobre dominado pelo mal grotesco, era de sua inteira responsabilidade matá-lo. Diz a lenda que eles se extinguiram afogados em seus próprios problemas e que seu mundo desapareceu num grande julgamento".

Fez-se grande silêncio;

“Agora voltem a beber o vinho de suas taças e agradeçam a bênção que nos foi dada com uma vida livre de medos e de criaturas como estas, capazes de destruir todo um mundo... Brindemos!”




30 junho 2008

As Portas do Tempo

A porta do passado está se fechando e você tem pouco tempo... Ela é estreita e grossa, pesada e veloz, quando olhamos pra trás a vemos se fechando.
Quando olhamos para frente vemos a porta do presente, e mais a frente desta, a porta do futuro, num corredor ora claro ora escuro.
À medida que caminhamos entre elas, por entre estas portas, somos seguidos por uma luz de certo fraca, pois se trata de uma vela que não nos deixa enxergar muito adiante de nossos próximos passos, nem muito atrás de nós.
Toda porta do passado que já existiu e se fechou, um dia já foi uma porta do futuro, e também de um presente, todas elas sem exceção, então não esqueça nada de que possa precisar no futuro cair ao chão e ficar trancado lá atrás da porta do passado, pois ela se fechará e jamais será aberta novamente.
Não esqueça nada, não se esqueça de fazer nada nem deixe algo pra depois, pois o depois não há como ser alcançado.
Então me diga se você tem vivido intensamente; se suas fotos têm marcado épocas; se as épocas têm sido marcadas por músicas; se as músicas te lembram alguém; se esse alguém te fez ou continua te fazendo feliz; se seus amigos te rodeiam; se é redundante dizer que os quer por perto; se a distância atrapalha; se você às vezes quer seu espaço... Diga-me se há algo a ser feito, a ser mudado; se você tem mudado; se a imaturidade se tornou cada vez menor e a maioria das suas ações tem sido mais humanas, mesmo com mais planejamento; me diga se há uma auditoria em sua alma pra organizar tudo o que deve sentir, ou para mover peças chaves; me mostre se a cave que abre o seu coração não está gasta por funcionar como numa fechadura de um cofre. Puxe com você a pessoa certa para atravessar as portas do futuro, deixe as erradas para trás, elas encontrarão outro alguém e outras portas.
Porém, se sua luz (lanterna vaga-lume encandescente), puder queimar mais forte com a parafina "made in" sua força de vontade motriz da mudança, aquela sua porta do passado poderá ser daquelas de se admirar e permanecer aberta pra se ir e vir conforme a vontade, sem aquela sensação de algo pesado... Você tem 2 portas a escolher, qual lhe parece melhor?


26 junho 2008

Uma rua chamada saudade



Descendo na contramão dos carros, tendo os pés fugindo da vista, pelo mesmo passeio que sabia de cor a medida dos meus passos, lá vou eu para o trabalho outra vez. O Biongo era um bar que dava gosto em frente passar, quando era este do outro lado da rua vinha muita gente repensar a vida nas cores de suas mesas e no frio dos seus copos que imitavam cristal, jovens corações amantes, perdidos de paixão e desejo se entreolhavam com juras de amor sem fim, ignorados pelos garçons suando em desespero de verão, e que em meio a malabarismos de bandejas tentavam sorrir pra disfarçarem a confusão quanto aos pedidos e numerações das mesas, agora, esse mesmo ambiente antes fervilhante de sorrisos e conversas vespertinas, nada mais é que uma tentativa agonizante de manter-se funcionando sem clientes, tudo culpa do proprietário. Sempre gostei como os olhos dos boêmios se perdem antes mesmo de chegarem à esquina, não enxergam nada que possa ser visto, apenas o que ninguém mais vê é percebido. Em frente à casa de Pedro Henrique, o que antes era a de Lucciano, agora fomenta o comércio e o desenvolvimento no que outrora era moradia de sonhos e vidas radiantes, um bairro conhecido pela calma e cumplicidade de seus moradores, vizinhos que estendiam as mãos para acompanhar o “bom dia”, hoje, apenas lembranças no concreto que muda suas formas sem perceber a dor no coração da gente. Uma clínica no lugar onde aprendi a ouvir meu silêncio, dois ou três escritórios no lugar onde escrevi minhas primeiras cartas de amor, advogados e seus sapatos sempre muito limpos disputando espaço onde antes eu rolava de rir e corria do perdigueiro que era o xodó de todos. A grama ainda existe, mas guardada por muros mais novos, daqui, do outro lado da rua, posso avistar o mesmo abacateiro de folhas grandes e tristes, que ainda hoje, se olho muito, choro, também sinto falta dos coqueiros que me falavam das suas saudades de uma ilha que jamais conheceram e do afiar de unhas do gato Tygra. E foi em frente a esta agora clínica que encontrei um contemporâneo tão saudosista quanto eu, não o percebi por andar sempre olhando pros meus pés, mas ele me chamou, e quando fraternalmente me abraçou disse que chorava sempre de saudade do nosso tempo de sol brilhante, rimos um pouco de algumas boas lembranças e nos entristecemos da dor da adultice crônica, mas já acostumados somos ao fim das coisas.
Ainda posso ver Fábio correr para a esquina, só para imitar o avô reclamando do contador de luz, ele podia fazer isso o dia todo, que ainda à noite estaríamos gargalhando. E lá vou eu pelo passeio onde aprendi a ter o coração cheio de sonhos e nunca deixei de entender os motivos de se ter os olhos rasos d’água.
Descendo na contramão dos carros, tendo os pés fugindo da vista, pelo mesmo passeio que sabia de cor a medida dos meus passos, lá vou eu para o trabalho outra vez.



*Taygra afiando unhas



25 junho 2008

De dez em dez





O que mais me preocupa nessa vida é a incerteza de quem eu vou ser daqui a dez anos. Toda vez que penso uma década, sinto uma mudança tão sutil que nem parece que mudou coisa alguma, daí o gostar de pensar em dez anos para trás. Em 98 minha fé era viva, em 88 eu era feliz ao som do Balão Mágico, em 78 eu também era atração em casa. 88 foi o ano em que vesti forçadamente uma camisa do Bahia, esse foi o estopim para torcer pro Vitória. Seu Benedito, o que me presenteou com tal desacerto já não mais vive, morreu no ano de 2003 sem que eu jamais tivesse coragem de passar por ele com uma camisa do rival do time que ele adorava. A cada década que volto rejuvenesço dez anos, mas não no corpo, fico jovem na alma, faz vinte anos que meu coração bate pelos mesmos motivos, meu temor-mor é que daqui a mais uma década eu desaprenda o caminho da volta, quiçá assim eu me perdesse pelo caminho e ficasse ali, no meio da estrada, queria me perder perto da década de oitenta, juro que nunca mais eu voltava pra hoje, muito menos pra amanhã...

26 maio 2008

Para não parar de acreditar



Toda vez que me canso de acreditar, sinto uma tristeza tão fria que parece não existir verão debaixo desse céu. Se fico quieto, querendo uma nova motivação, acabo por contentar-me com as de costume, afinal, não há sempre motivo novo que faça uma fé perdida florescer, nem quietude de vida que suscite frutos. Todo aquele que acredita é sempre mais forte na dor, e mesmo disso sabendo, me acomodo no vazio que a fuga de todas as minhas crenças produz. Minha fé é a saudade que possuo da minha infância, é também essa vontade em mim de reencontrar com alguém que não sou mais. Daqui a alguns anos saberei - talvez - o preço que o deixar de acreditar requer. Por enquanto, eu acredito. Acredito no amor que os jovens corações apaixonados juram, acredito que destino é o que fazemos com nossos passos, acredito no Único que possui palavras de vida, acredito na inocência dos meus pequenos, acredito nos soltos anacronismos parafraseados por Pedro em suas cabíveis épocas, acredito no pedido de perdão dos de coração contrito, acredito no choro que a saudade do filho recria. Eu ainda acredito.

14 maio 2008

"Toda criança tenha a Estrela dentro do coração."



De tanto querer, aprendi cedo o valor do confortar-se. As coleções da Glaslite e da Estrela lambiam meus olhos a cada nova vitrine natalina. No mês de outubro, o apelo consumista já assenhorava-se de todos os meus onirismos. Dia das crianças serve mesmo é para machucar pequenos corações humildes, mas eu me calava. Houve uma época em que o meu falar era pouco, tinha traços de quem ainda não aprendera a interagir com o mundo à sua volta, era tímido, com receio de tudo e de todos, desconfiado. Hoje, falar demasiado tornou-se o meu pior eu. De todos os eus que fui, nenhum se equiparava ao da infância, este foi o melhor que houve. O eu de hoje nem sou eu, é outro que não reconheço em minhas atitudes e em meu falar, e por falar nisso, minha atual loquacidade frívola quase sempre faz com que tenha outra vez saudades deste que falava pouco e tampouco se importava com o “não ter”. Quero mais uma vez aprender a não falar sempre tanto, usar mais o meu calar. Como disse uma célebre raposa: “a linguagem é uma fonte de mal- entendidos”, e farto estou de equivocadas interpretações. Não mais me importarei em não ter, ainda que Estrela, Glaslite, bons amigos, amores, infância, inocência. Seja meu calar minha melhor compreensão deste mundo tenebroso e destes homens frios e sua fúria desmedida.

10 maio 2008

apaixonantes e apaixonados



Existem pessoas apaixonantes... Quando se gosta de alguém seu mundo se torna diferente, existe “um trem para as estrelas” onde podemos subir deixando a estação do vazio para trás rumo à estação do sorriso fácil...
Ficamos ali tentando imaginar como aquela pessoa pode existir, como ela preenche nossas expectativas, nossos anseios, nossos gostos. É como se ela tivesse sido criada por nós mesmos, em algum outro universo paralelo, pra nós, pois só nós sabemos o quão perfeitamente ela se encaixa na fenda do nosso coração.
Esta pessoa nos causa taquicardia, sudorese e nervosismo, ela entra constantemente dentro dos nossos sonhos sem pedir licença, tendo acesso livre a noite quando não podemos fingir... É quando nos sentimos confusos, pois não sabemos se a odiamos por não tê-la ou a perdoamos por não nos amar.
Às vezes ela fala conosco outras vezes não, e quando ela passa por nós não sabemos nos comportar, não sabemos para onde olhar, não sabemos mais nada!
Existem pessoas inalcançáveis, não por assim serem de fato, mas por assim ser a vida, por tamanhas dificuldades e diferenças, crenças e modelos. Existe uma linha que nos separa, traçada antes mesmo de haver um primeiro contato ou olhar, existem “muros de concreto entre nossos lábios”, há o que o tempo chama de: “Quase” ou de: “quem sabe da próxima vez”.
É aí que a vemos ir para outros braços, alguém melhor que nós, julgamos, e queremos tanto bem a essa pessoa que compreendemos que assim será melhor pra ela, ela estará mais feliz, numa forma de relacionamento mais compatível que o que podemos oferecer, ao ponto de nos sentirmos culpados por não sermos, por assim dizer, capacitados a receber amor de volta.
Fazemos uma trouxa enrolada em papel vermelho cor de coração partido, com uma vareta empenada de desolação e desconforto, damos aquele suspiro forteeee e seguimos em frente fingindo que nada aconteceu, fingindo, fingindo...
Somos apaixonantes e apaixonados o tempo todo, talvez tudo esteja na nossa cabeça, talvez desse certo, talvez não... “Talvez” seja a palavra perfeita pra esse sentimento. Luiza Braz disse que “Bastava ela ter certeza que suas certezas iam lá e se jogavam, que suas certezas eram suicidas”.
Se soubéssemos os tormentos que causamos aos outros sem saber, se pudéssemos saber quem se interessa por nós ficaríamos encantados e admirados! Não haveria desencontros nem receios salvo, pela recíproca verdadeira.

16 abril 2008

Aos trinta e dois




Conte-me mais sobre o motivo pelo qual te alegra tocar minhas mãos ao deitarmos, dê-me mais, pois sempre é bom ter calma para viver os dias, eu sei que à noite nós iremos conversar outra vez e concordaremos num mesmo ponto, você não mais me vê como seu, eu não mais vejo o que existia de ontem em você. Apaixonante, era apaixonante nos ver, agora eu vejo você se afastando, porque sou eu quem está partindo, aos poucos estou deixando coisas para trás, o tempo cai pelo chão a todo o instante, escorre entre nós, nossa memória esqueceu-se do que nunca deveria ser passado, e eu, que passei os anos à procura do que me fazia feliz, agora passo mais um sem encontrar o que quis.
Foi uma manhã triste a de anteontem, uma segunda-feira como outra qualquer se não fosse o dia 14. Eu nasci aos catorze dias do mês de abril de um ano do qual não sei nada, em 76 eu nem era eu ainda.
O desejo de sentir frio superou meu amor pelo calor.
Outro capítulo, outro ano, e a mesma busca, a mesma vida, é sempre a mesma vida, como sou imaturo.
Até quando serei?


Parabéns para mim, que há trinta e dois anos odeio vê-los passar...

08 abril 2008

O costume da saudade



Existe uma sensação que prende o fôlego, isso entre o peito e a garganta, e eu a conheço tão bem, sendo assim, ela já não mais me espanta. Tão desapontado, agora, por não mais surpreender-me com o nó causado, mas nada hoje é novidade, nem mesmo o tempo desperdiçado, talvez, culpa da idade, talvez, o costume da saudade, quiçá, a distância de uma metade. As metades ausentes, palavras murchando, secando e secando e a dor na solidão da gente, alguém ao longe, como quem passa de largo, teu nome vai assobiar de repente, e o céu encoberto de dúvidas, aumentando da língua o amargo, vai destilar fins de tarde nas manhãs de um coração carente.

13 fevereiro 2008

Tristeza



A tristeza faz a gente pensar a vida diferente, não pior, nem melhor, apenas diferente, e tudo o que geralmente acontece por força desse sentimento é visto como poético, belo, reflexivo ou coisa assim. Talvez a poesia sonhe em ser sempre triste, para que nunca precise isentar-se de sua beleza.

[Trecho de uma conversa com Amine]




"A maior parte das pessoas é tão feliz quanto resolve ser."(Abraham Lincoln)

28 janeiro 2008

Dois litros de tempo



Onde quer que exista o tempo não existirá só isso, existirá também a falta dele. Os minutos que me despertam pela manhã passam o resto do dia fugindo de mim, escorregando pelas mechas dos meus cabelos, não os consigo descobrir no branco do relógio na parede à minha frente, não os posso agarrar no colorido relógio em meu ainda jovem pulso esquerdo. Se é a noite maior enquanto olho a rua, permaneço só, por assim o ser, só para que passem mais rápido as horas, mas quando sozinho, o tempo é sempre vagaroso e anda aos tropeços com a ajuda de alguns poucos minutos cegos, os mesmos que costumam me despertar cedo e passam o resto do dia fugindo de mim. Poucos sabem, mas um minuto às vezes é meio, (experimente ter alguém que você gosta ao seu lado), não é de conhecimento geral, mas por maldade, (afinal, o tempo é mau) ás vezes um minuto não é um, mas quinze, quem abraça a solidão sabe do que estou falando. Os minutos são como companheiros infiéis, suas horas passam antes mesmo que possamos compreendê-los.

23 janeiro 2008

Para minha vó

Minha querida venha aqui que tenho algo a te contar, mas venha logo, pois não gosto de esperar por nada. Eu sei que o tempo andou mexendo contigo, mudou a cor dos teus cabelos, a textura da tua pele, mudou teu nome e te fez mais triste. É que o tempo, meu amor, gosta de brincar com a gente em dias de dor. Vamos nos deitar um pouco e esperar que ele passe, ou que passe a dor, já que não se pode ultrapassá-lo, nem uma dor pular. Cabelos grisalhos, outrora negros, (lindos) pele enrugada, um dia tão macia, (gostoso toque) e um nome que se pronunciava de fora pra dentro (Vó). Hoje a senhora não pensa em dizer mais nada, ainda que de dentro pra fora. Reconheço a beleza de ter gerado minha mãe em tua barriga e a barriga desta que inventou a mim. Vou correr, eu e minha barriga com um céu e duas ruas inteiras para gastar teu tempo conversando comigo, digo... conversado com a gente, porque na falta de ouvidos tu conversas consigo mesma. Coisa de quem gerou uma mãe que inventou um filho, e assim foi com uma barriga e foi mesmo da barriga que a mãe fez este que ama e um dia pulava no colo desta, sem vontade de sentir o tempo que nunca sente dor, nem tem barriga. Minha querida venha aqui que tenho algo a te contar, mas venha logo, pois não gosto de esperar por nada, então não pare você de viver ainda, é que o tempo não vai nunca parar, o tempo não para, nem pare, parir é para quem tem amor e barriga, mas este, o tempo, nem ama nem emprenha...

21 janeiro 2008

Perceba







Será que os humanos percebem a vida enquanto estão vivos?


Não. Os santos, as crianças e os poetas, talvez...

15 janeiro 2008

O Servidor Público



Reza a lenda que um servidor mais do que público, meteu-se a fazer graça ao povo e da graça que fazia, rodeando as pessoas de felicidade e de alegrias - tudo isso de graça e pela graça de Deus - rodou, rodou e caiu de tontura com as mãos na testa, poff!

-Acudam! Valei-me Jesus Cristo que o homem ta passando é mal – gritou da soleira da porta um jovem, que de vermelho de risos, ficou branco de susto vendo aquela cena inédita.

- O que houve? – todos perguntaram.

- Iiiiiii parece que o servidor não vai mais fazer graça em público – desenganou logo o enfermo uma mulher de poucas palavras e esperanças.

- Isso é molecagem não vêem?! Está fingindo!

Em meio a tantas suposições, o servidor, o agitador das massas e das emoções, o bobo voluntário da corte renasce das cinzas meio trôpego, mas socorrido descobre no hospital das clínicas de não sei das quantas, que não pode mais exercer sua profissão. Um choque, uma aposentadoria prematura e inesperada.

O facilitador de risos nunca mais foi o mesmo, recaiu sobre ele uma nuvem negra de solidão e esquecimento, a vida seguiu o seu rumo veloz, e ele perdera seu papel na estrutura determinista mundana das funções na terra. Depois de tantos anos dedicados a comédia e ao circo do entretenimento humano, nas 4 estações do ano e nos 365 dias e 6 horas dos anos bissextos, em mais um dia de fevereiro não lhe renderam muitos bens... Anos depois, doente, frustrado e maldito, o servidor público não encontrou uma só alma que o fizesse sorrir com alguma graça.

Ser agradável e engraçado era uma tarefa árdua, foi então que ele doutrinou um desses meninos de rua, com toda sua técnica e extrema maestria e então ele ria, ele ria... Cumpriu o seu papel e ficou um tanto rico ao montar uma escolinha de comediantes mirins, mas o mais impressionante é que ninguém o viu tão feliz como no dia em que Pablito gonzáles, seu pupilo, deu entrada na UTI do hospital geral do estado, junto com 18 pessoas da platéia, apresentando quadro clínico de risotonia gargalhal aguda, batendo o Record pan-americano de aposentadoria prematura vitalícia com grande louvor.


12 janeiro 2008

Sorvete, carinho ou os dois?



Um carinho... Com cobertura de abraços apertados e recheio de cheiros e lambidas, alguns flocos de beijos semi-roubados e muitas pseudo-mordidas, estas espalhadas por cima pra dar um aspecto de verão, tem calda de promessas daquela verde-esperança e juras diet de amor eterno para que com a ranzinza balança não haja preocupação.
Um carinho.
Está tão barato não acha?
Um carinho.
Toma logo, se derreter perde a graça.

09 janeiro 2008

Para minha vó


Entendo a perplexidade instante de teus olhos quando admirada de si mesma contemplas tuas mãos velhas e cansadas, compartilho enfadado uma dor que naturalmente ainda não a suporto ao ver-te encharcada de toda a humanidade que te mareja os olhos, diluindo junto com as lágrimas a tua alma triste, organizo minhas e tuas lembranças para saber sorrir dos dias em que me tomava pelas mãos e cantava pedaços de sorrisos, fragmentos de tua paz ainda colorem minhas noites ruins, então sei que nunca é em vão a vida dos que amam. Percebo calmamente cada dor em teus gestos de solidão, mas tu nunca estás sozinha vó, leva contigo minhas cores pra onde quer que tu vás.
Eu sempre percebo os momentos em que tu oras pedindo a Deus alguns últimos pedaços de arco-íris...

07 janeiro 2008

Verão


Palavras de emoção
Já vem vindo o verão
Canto do fim de primavera
Calor no coração
Não quero ouvir mais nada
Em mim já é verão
Palavras de emoção
Canto do fim de outono
Não quero saber mais nada
Em mim já é verão

03 janeiro 2008

Mais um ano, mais humano


Mais um ano, e eu, humano que fui e mais humano que antes, deixei na curva sumir ao longe o laço do abraço não dado, como que pelo retrovisor observei atentamente perder-se no caminho a saudade não interrompida, um desejo não saciado, os olhares e sorrisos nunca trocados, vi pés distanciarem-se sem nunca terem se aproximado. A dor, só esta foi companheira na partida, foi amiga na saída de uma vida não sentida, do amor nunca feito, assim, sem chances ou oportunidades, desperdiçadas ou não. Espero que o tempo passe, e em verdade eu o vejo voar mais rápido do que a luz, mas não há bem algum nisto, a impulsiva ampulheta do tempo só roubou-me o brilho nos cabelos e a alegria dos olhos, esse tempo que é impaciente, não faz idéia do que é uma vida inteira em distância de sonhos em comum. Se eu fosse esperar você, seria mais feliz, esperaria um pouco mais... E um pouco mais, e seria por longo tempo, e eu seria grato por entender que o tempo passaria, ainda que agora com velocidade reduzida, já que este, (o tempo), possui velocidades diferentes para cada situação que o coração viva. Eu não possuo grandiosidades, mas isso não é o principal para a alegria dos que se doam. Meu presente minhas palavras são, meu abraço é, eu espero que o tempo passe, e agora tanto faz a marcha que ele use, não há pressa alguma em viver infeliz. Isso é o que todos esperam da vida, a cadência de lindos sorrisos enfeitando doces palavras sussurradas, os cabelos afagados por mãos parindo carinhos, olhares que cintilam como estrelas fingindo uma instante ausência de medo, eu sei, só precisamos de tempo, esse mesmo que corrói a alegria de muitos, mas que tentando redimir-se do mau que quase sempre faz, aprendeu a curar feridas, suavizar despedias e acalmar a angústia dos que se perdem de amor.
Mais um ano, e eu, humano que fui e mais humano que antes, vi pés distanciarem-se sem nunca terem se aproximado...