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27 novembro 2007

Palavras que não são para serem lidas por você


Acordou antes do sono, levantara, despertara, mas continuava dormindo. Em meio aos cochichos no canto da sala, saiu, sentou-se e não abriu os olhos, ao contrário, fechou-os para que aquecessem o papel frio pela madrugada, abriu sim, mas uma pequena e empoeirada gaveta para apanhar alguns lápis e uma caneta, foi quando imaginou ouvir e ouviu. Inclinou-se, encostou a orelha e jogou os olhos, agora no interior dessa mesma gaveta, pra ver se entendia o que ouvia. Eram murmúrias e lamentos, algumas vezes, espirros, abriu mais, até o limite, foi quando pode então ver, tantas palavras adoecidas, tão tristes, enfraquecidas, umas eram mais velhas, estavam de óculos, cabelos grisalhos, nem se usa mais, outras já calvas, a maioria de bengala em punho, equilibrando-se assim, pois esqueceram-se de como se equilibrar entre elas, sequer conseguiriam formar uma interjeição, negação, uma afirmação, outras mais jovens, ainda de fraldas e chupeta choravam baixinho também, eram inexperientes demais para soarem, eclodirem, estavam cabisbaixas e fracas, faltava-lhes alimento. Pensou em fechar rapidamente a gaveta e fingir que nunca as vira, mas era impossível para ele que tinha tantos sentimentos nos dedos e elas continuariam lamentando alto, resolveu então que faria o que julgava certo, e o fez. Apanhou uma por uma e as afagou, as esfregou, apertou junto ao peito para aquecê-las novamente, a umas lavou e regou com lágrimas, a maioria precisou de borracha para desfazer os deslizes gráficos, as desconcordâncias verbo-nominais, a outras o choro de imediato foi calado quando viram a caixa de giz de cera que ele apanhara para colori-las, que lindo que era de ver, ficaram todas radiantes de alegria, seria verdade mesmo que os Lápis de Cor, os de Cera, logo eles, aqueles seres superiores as iriam pintar? Afinal, eram eles anjos de cor. E desse modo foi, uma a uma foram coloridas, algumas precisaram ser completamente refeitas, em gênero, número e grau diferente, mas ficaram de fato todas contentes. Agora, não mais precisavam das bengalas, que por sua vez foram abandonadas na sala, já que podiam equilibrar-se entre si, apenas com a ajuda de algumas preposições, e assim, frases inteiras, períodos e orações, tudo cheio de emoções eram criados, e juravam as palavras que estariam sempre ao seu lado enquanto vivessem ou elas ou ele e foi bom de ouvir. Sorriu ele satisfeito com o trabalho, o papel, agora aquecido lhe pareceu por um instante sorrir também e as palavras lhe escorregavam pelos dedos, brincando, gritando e fazendo algazarra, como num parque sábado à tarde. O mesmo papel, antes branco, agora azul, era a piscina na qual se jogavam estas mesmas palavras, tão felizes, tão felizes, a troco de nada.

21 novembro 2007

Motivos... Gerais




Haveria quem provocasse o sorriso, ainda que semi... Real. Pela bebida, pela comida, por não mais causar a ferida, pela casa, pelo quarto, pelos amigos e ainda assim, o pensamento trazia outro motivo para esse mesmo esboço do que se chama sorriso. Motivos gerais, logo depois da Bahia...
Mas se viajo, ainda fico precisando de alguém para ser dono das fazendas, das casas e dos carros que passam à minha esquerda quando estou viajando.Os da direita ainda são meus, e como numa viagem, pra lá, aonde se faz divisa com a Bahia, divisa de minha alma, divisa de minha vida, o retorno é algo indesejado.

19 novembro 2007

A praia


Praias inteiras sofrem hoje por falta de desertores da dor.
Homens que passam os dias admirando grilhões, mulheres que levam anos com seqüelas de lágrimas nunca antes abstratas, num concreto cárcere de silêncio, alheias aos raios de sol e ao azul que o mar rouba do céu em dias de felicidade. O que está escrito em seus corações é mais do que uma carta de alforria manchada de tinta onde deveria haver uma assinatura e as praias esverdeadas, que invejam a cor do céu, apenas esperam infiéis de uma vida comum, desertores de um mundo sem maravilha alguma para nenhuma Alice, que não entendem o prêmio maior de viver...

16 novembro 2007

Decoração




E o coração outra vez perdeu o gosto por se perder. Mas o que se há de fazer quando tudo o que encontramos tropeça em palavras caídas ao chão? Tropeços não fogem dos pés, adeus não se escondem das mãos, caminhos são largos quando o caminhar é torto, quanto aos pés, esses decoram o caminho que a boca confessa, mais do que nossas próprias memórias, quem decora as margens não são só os de árvores, mas também, pés de tudo o que o corpo abandona deixando cair pelo chão. Decore o texto, decore a música, decore o livro, decore o nome de tudo o que te é importante, decore bem o seu quarto, nunca se sabe quem você irá querer lá levar a qualquer instante.Decore bem o seu dia e nunca tente dizer adeus pra quem você não pretendia...

14 novembro 2007

Abandono




Acordou aos onze, nem percebeu que tinha pouco tempo pra terminar de viver o dia, havia dormido aos trinta e um, um progresso fantástico. Esforçava-se cada vez mais pra chegar á fase sonhada. Tantas coisas ainda a abandonar, trabalho, mulher, bebida, contas a pagar, era tudo difícil, mas ele acreditava estar agora bem mais perto do ideal, afinal, perdera vinte dormindo, virar criança dá muito trabalho. Lembrou que precisava passar na mercearia pra comprar umas jujubas e um álbum de figurinhas do campeonato brasileiro. Agora, já nem parecia tanto a abandonar, sentiu vontade de voltar a ir ao banheiro, fazer xixi, ligar o chuveiro e não se molhar.