Existem muitos jeitos de se viver a vida. E, não se engane, também existem muitos jeitos de morrer a vida. A morte é só o mais conhecido. Eu tenho esse problema, sabe, não consigo reter nada que importa, minha memória só é boa para reter inutilidades, nisto sou o melhor do mundo, lembro do dia em que tinha um ano de vida e minha mãe precisou pegar um táxi às pressas para me salvar, uma vida que só tinha um ano ainda, lembro que chovia muito, era noite e fazia frio, lembro da agonia das pessoas tentando ajudar, e do burburinho sem sentido algum para mim, e até da hora que cheguei ao hospital, consigo me recordar das feridas por todo meu pequeno, magro e frágil corpo de apenas um ano de vida, e da coceira e ardor que causavam-me, é interessante como as pessoas são uníssonas em dizer que é uma capacidade que beira o "sobrenatural" a de lembrar-se de algo quando você ainda era demasiado pequeno, mas para mim isso sempre foi tão normal. Mas, não consigo entender o motivo de eu não me lembrar de nada que importe aos ouvidos alheios, quem quer saber suas memórias prodigiosas de quando tinha somente um ano de idade? Enquanto escrevo, meu amigo Pedro me escreve dizendo que "nossa vida é o resultado das nossas escolhas idiotas", meu Deus, eu nem escolhi nada! Talvez aí esteja o erro, não decidir também é escolha, acho que minha vida entrou em desuso quando eu virei adulto, antes eu costumava ser divertido, mas tudo se inverteu com trinta anos vividos. Invertido é uma pessoa que ficou divertida pra dentro, e que por fora, ninguém sabe, ninguém te acha legal, ninguém ri de suas piadas, ninguém te quer por perto, a verdade é que ninguém nunca me enxergou, a não ser quando para zombar de mim, para me ferir por dentro, bem onde eu era divertido, isso é pura maldade. Para todas as coisas que não se dá para enxergar é preciso inventarmos palavra para poder marcar sua existência. Um dia entendi que a vida fez um sobrevoo sobre minha cabeça e então eu finalmente cheguei nesse lugar onde todas as pessoas parecem saber se lembrar de coisas maravilhosas que viveram, vivem e quiçá, ainda viverão, coisas que existem, que já nasceram nomeadas, sobre estas pessoas penso que sequer dormiriam, se assim pudessem escolher, veja que digo que as pessoas que vivem nem dormiriam se pudessem, essa é a verdade, mas é incrível como elas amam o sono, já que estão sempre cansadas de tanta vida boa que vivem. Penso que meu sono nunca me lembrou saúde, ele está profundamente conectado com depressão, eu costumava dormir muito quando não queria viver, mas aí veio a insônia. Por isso, quando eu fico um ou dois dias sem dormir, significa que perdi mais uma batalha nessa guerra, dormir pouco é uma luta pela própria vida, acredito que o melhor sono que existe será sempre aquele que nunca precisou existir. Já não sei mais sobre o que escrever. Minha vida é uma fúnebre eterna luta contra a irrelevância...
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